terça-feira, outubro 30, 2007

A arte de meter a mão na massa

Ingredientes:
100g de farinha
1 boa dose de garra
paciência qb

Receita:
Juntam-se todos os ingredientes e mete-se a mão na massa. Sova-se com garra até doer os braços, aguarda-se com paciencia que cresça e decide-se com inteligência o modo de apresentação.

Explicações:
Sempre gostei de meter a mão na massa. Em todos os sentidos da frase. Detesto ficar apenas a pensar como seria, sem nunca tentar. Adoro a sensação de começar a juntar os ingredientes um a um, tentando perceber se algo está mal e depois o melhor: socá-la violentamente em busca de um resultado final.
Há que saber rodopiá-la quando o caminho que estamos a seguir não é o correcto. Pôr um bocadinho mais de água quando a situação começa a ficar dura. Mas há que continuar a sová-la até chegarmos ao ponto certo.
Mesmo nos tempos de espera, como no da levedura, temos de saber ter a paciencia necessária e ficar atentos debaixo do cobertor que tapa o alguidar... qualquer brisa que entre na massa pode mudar o rumo da história e lá voltamos nós à fase do amassar.
Seja ela folhada ou quebrada é sempre com muito prazer que a estendo no tabuleiro e escolho a forma de apresentação. Por vezes em pequenos bolinhos, servidos rapidamente para os comilões mais ávidos. Noutras vezes, embora sejam poucas, guardo tempo para decidir qual a forma mais bonita e inteligente para transformar a massa num bolo forte.
A maior satisfação vem quando alguém trinca o produto final e, além de gostar, entende a essência de todos os ingredientes adicionados na massa que tanto exigiu de mim. Talvez por isso goste tanto da minha profissão. Por falar nisso, está na altura de meter a mão na massa. Só espero que não saia daqui um pão esfarelado.

segunda-feira, outubro 29, 2007

Bechamel de procura de respostas

Ingredientes:
1 pacote de insatisfação
1 raminho de respostas

Receita:
Deita-se o pacote de insatisfação da sociedade numa taça alta e bate-se até esta ficar endurecida com as dificuldades. Na horta procura-se o raminho certo das respostas para polvilhar.

Explicações:
O homem nunca está totalmente satisfeito. Várias conversas têm-me levado a este tema e ontem, enquanto corria no estádio universitário em busca de alguma evasão, dei por mim a pensar nisto. Vivemos na era da procura incessante das respostas aos milhares de porquês que nos surgem de rajada. É como se vivêssemos constantemente à beira do abismo: queremos ter alguém, mas ao mesmo tempo temos medo de nos comprometermos; queremos crescer na carreira, mas também não queremos ser escravos do trabalho; queremos realizar os nossos sonhos, mas não temos coragem para deitar as obrigações para trás das costas e correr em busca do que nos satisfaz. O que fazer então? Estamos condenados à insatisfação?

"A religião é o ópio do povo", dizia Karl Marx. Mas hoje em dia a busca de respostas é feita de outras formas. Desde os livros de auto-ajuda - como o agora na berra intitulado “O Segredo” - a retiros espirituais ou até mesmo idas a cartomantes, a sociedade procura desesperadamente algo em que possa acreditar. Que dê um conselho sábio para ultrapassar a sensação de estarmos incompletos. Um caminho a seguir.

Será este um reflexo da competição em que vivemos actualmente? O ritmo aperta, todos os dias temos de provar aos outros, e a nós mesmos, que somos bons. Não há espaço para falhar. Há uns tempos alguém me dizia… e com razão: “As coisas valiosas não têm de ser alcançadas obrigatoriamente com esforço. Devíamos dar mais valor quando as conseguimos facilmente”. Vou tentar, prometo.

sexta-feira, outubro 26, 2007

O prego da reconciliação

Ingredientes:
1 noite de gala
200g de bife do lombo
Mostarda de reconciliação qb

Receita:
A uma noite de gala juntam-se dois estranhos que se deviam conhecer muito bem. adiciona-se um bom bife do lombo e rega-se com mostarda de reconciliação.

Explicações:
Sempre tive dificuldades em perdoar. Mas a vida surpreende-nos. “O perdão é essencial se queremos viver em paz”, disseram-me há uns tempos. Ontem percebi finalmente quão verdadeira esta afirmação é.

Durante muitos anos vivi com o rancor a remoer cá dentro. Quase como uma malagueta que me sufocava mas que eu recusava em tirar da boca. Preferia trincá-la, esmigalhá-la - em sinal de vingança - mesmo quando a língua me ardia com vontade de dizer “chega”.

O passado nunca vai mudar, por mais voltas que se dê. Mas o futuro está nas nossas mãos. Ontem à noite, ao som de uma magnífica orquestra no Teatro São Carlos, olhei para Ele como se fosse a primeira vez. Baixei finalmente as defesas. Dei por mim a gracejar com cumplicidade, a acompanhá-Lo como se sempre o tivesse feito. Entre alguns copos de champanhe, dei conta do seu sorriso orgulhoso por me ter ao seu lado. “Estás a gostar?” Perguntou-me baixinho. “Estou a adorar”, respondi piscando o olho.

Este simples diálogo, com um sorriso mútuo estampado nas nossas caras tão iguais, foi o início do fim da guerra. Circulámos entre os convidados como dois anfitriões. Acabámos a noite no Faia, a casa de todas as tradições da minha família. Em frente a um prego do lombo senti que o gelo finalmente se quebrara. Conversámos sobre viagens e trabalho, talvez os temas que mais nos unem.
Ao fim de doze anos voltei a sentir-me a “sua menina”. E soube-me muito bem.

quarta-feira, outubro 24, 2007

Pudim de nem sei bem o quê

Ingredientes:
1 frase
500g de reflexão

Receita:
Do nome de um livro tira-se umas gramas de reflexão. A conclusão, essa não existe.

Explicações:
“Queria de ter alguém à minha espera num sítio qualquer”. Quem não queria? Cada vez que olho para este livro da Anna Gavalda, há meses em cima da minha mesa-de-cabeceira, sinto uma saudade inexplicável. Do quê não sei ao certo.

Será inevitável sentirmos vontade de ter alguém à nossa espera? Alguém que tenha um sorriso cúmplice para dar. Um abraço apertado. Um beijo sentido. Um simples: gosto de ti.
Sinto saudades, não sei porquê. Será a vontade de voltar a sentir o coração descompassado? Não sei. Mas gostava ter alguém à minha espera num sítio qualquer.

terça-feira, outubro 23, 2007

Pote de mel

Ingredientes:
1 pote de mel
1 raminho de elogios sinceros

Receita:
Abre-se um pote de palavras melosas, que se juntam inesperadamente ao raminho de elogios sinceros até o ego rebentar de satisfação.

Explicações:
Sabe muito bem ouvir alguém dizer que nos acha bonita. Mesmo quando nos sentimos bem na nossa pele, esta é uma frase que soa como mel nos nossos ouvidos.
Na semana passada tive a oportunidade de almoçar com dois amigos que já não via há umas semanas. Amigos daqueles que me conhecem de ginjeira, que não precisam de me agradar com falinhas mansas. Após alguns segundos reflexão, do alto da sabedoria dos seus 38 anos de experiência com o mundo feminino, um deles abriu o pote do mel: “Tu és uma mulher muito bonita. Espero que tenhas noção nisso”. Apanhou-me desprevenida, devo confessar. “Os teus olhos são magníficos. Reflectem tudo o que tu és. Sensibilidade e inteligência”.
Já há algum tempo que ninguém me dizia algo do género… e soube-me muito ouvir. Talvez porque sei que nenhuma daquelas palavras continha mensagens subliminares. A sua sinceridade foi tal qual o néctar das abelhas: límpida e doce. Guardei aquelas frases num frasquinho, que escondi numa prateleira do meu ego para só voltar a abrir naquelas alturas em que me sinto uma gata borralheira. A verdade é que, nesse dia, depois daquela conversa, senti-me realmente bonita.

segunda-feira, outubro 22, 2007

Quiche de comportamentos estranhos

Ingredientes:
Vários quilos de um namorado
500g de comportamentos estranhos
1 pitada de cegueira da paixão

Receita:
Dos vários quilos de namorado retiram-se 500g de comportamentos estranhos que só se revelam na intimidade. Adiciona-se uma pitada de cegueira da paixão e leva-se ao forno até cheirar a queimado.

Explicações:
Alguma vez se viram numa situação digna de um filme do Almodovar? A maioria das mulheres sim... na intimidade de uma relação amorosa. É aí que os homens revelam o seu lado mais estranho, por vezes engraçado, mas noutras alturas digno de uma ida ao psiquiatra.
Num jantar de sábado, que se prolongou até de madrugada, dei por mim a ouvir as histórias mais mirabolantes sobre vida amorosa de algumas amigas. Chegámos à conclusão que nós, no auge da paixão, tendemos a deixar passar despercebidos todos os sinais patológicos do mais-que-tudo. Não devíamos. Aqui ficam alguns dos pormenores mais inexplicáveis que nós já aturámos:

O namorado/equivalente que:

- Durante um ano seguido comia peixe com batatas cozidas ao almoço e bife com batatas fritas ao jantar (mesmo em restaurantes não mudava o menu)
- Cantava animadamente músicas do Quim Barreiros no duche, logo de manhã
- Precisava de tirar a roupa toda para ir à casa-de-banho
- Discutia sozinho
- Tinha uma pochete para transportar os preservativos
- Acordava a meio da noite várias vezes e dava pancadas na namorada para ver se ela continuava lá
- Quando chegava a casa da namorada a primeira coisa que fazia era tirar as calças
- Tinha a paranóia das lavagens obsessivas pós-sexo
- Usava compulsivamente batom do cieiro
- Trazia um saco com medicamentos para todos os gostos quando a namorada tinha apenas uma gripe
- Controlava o telemóvel da namorada em busca de uma traição
- Usava os cremes de beleza da namorada
- Empilhava os pratos sujos (com as espinhas!) no lava-loiças quando tinha máquina de lavar
- OS que adormeciam mal acabavam de ter relações (temos também as variantes “adormecer no sofá”, “adormecer no cinema”, etc)

Que pormenores estranhos nós mulheres teremos na vida a dois que sejam alvo de escrutínio público pós-relação? Olhando para trás, nenhuma de nós consegue perceber como conseguiu aturar algumas destas situações... mas o coração tem destas coisas. Fica a pergunta: serão todos os homens assim ou andaremos nós constantemente apaixonadas pela pessoa errada?

sexta-feira, outubro 19, 2007

Batido de revelações

Ingredientes:
1 desafio de uma amiga
Várias pitadas de revelações

Receita:
Uma certa senhora lançou-me um desafio público no seu blogue: escrever a receita do meu batido pessoal em formato de brincadeira de meninos do 5º ano. Aqui vão algumas pitadas de revelações sobre a mestra da culinária.

Explicações:

Olhos: Difícil! Há quem diga que são verdes, outros garantem que são amarelos…
Cabelos: castanhos claros… de vez em quando nascem umas madeixas douradas
Altura: 1,68 cmAscendência: tuga mais tuga não há!
Signo: Caranguejo, ascendente em Capricórnio
Sapatos que estou a usar: umas sabrinas que me custaram uns míseros 3 euros na feira
Fraqueza: uuuuiiii…tenho muitas. Mas tenho de manter a imagem da mulher de ferro!
Medo: uma fobia incontrolável por pássaros que aumentou com a minha ida a Veneza (vá, gozem à vontade)
Objectivos que gostaria de alcançar: sou uma idealista e claro que tenho alguns projectos humanitários com que sonho desde pequena. Mas para os concretizar tenho de me sentir bem comigo mesma e esse é o meu objectivo número um todos os dias.
Frase que mais uso no Msn: partes de letras de músicas… nada original, eu sei
Melhor parte do corpo: Tenho um certo fascínio pelo meu nariz mas não me perguntem porquê
Pepsi ou cola: cola, com gelo e limão, num copo alto
MacDonald's ou Bob's: Não há nada como a comidinha caseira… eu e o meu fogão temos uma paixão mútua
Café ou Capucino: a bela da bica a mim ninguém me tira de manhã! Adoro café! Mas bebo mais do que devia, confesso.
Fuma: nop
Palavrões: Dizer um palavrão bem alto é libertador. A conduzir nem se fala. Quando vou para um país estrangeiro é das coisas que mais gosto de aprender. Resumindo: adoro dizer uma bela caral…da!
Perfumes: Lacoste for women.
Canto: sou a ovelha negra da família. Os azulejos da minha casa-de-banho podem comprovar
Tomo banho todos os dias: para mal da conta da água…
Gostava da escola: Sim. Quando estava de férias aborrecia-me passado pouco tempo.
Acredito em mim: É a chave do meu dia-a-dia
Tenho fixação com a saúde: sou uma desleixada… já nem me lembro da última vez que fiz análises
Dou-me bem com os meus pais: quem me conhece já se deve estar a rir. Em vez de uma relação, digamos que tenho antes uma ralação com eles.
Gosto de tempestades: se eu estiver deitadinha no sofá com uma mantinha sabe muito bem

No último mês...
Bebi álcool: não resisto a um bom vinhoFumei: não
Fiz compras: claro, sou gaja. Mas tudo a baixo custo!
Comi um pacote inteiro de bolachas: nããããoooooo… mas tive vontade quando comprei um pacote de supremas de chocolate!
Comi sushi: baaahhhhh odeio sushi
Chorei: Sou uma lamechas. Basta-me ver um filme ou até mesmo a Oprah e debulho-me em lágrimas.
Fiz biscoitos caseiros: fiz uns scones na Bimbi da Gilinha que estavam de comer e chorar por mais!
Pintei o cabelo: Nunca
Roubei: sim, umas leggins, à minha mãe :p
Número de filhos: muitos, só em pensamentos
Como quero morrer: oh, como toda a gente: quentinha, a dormir e sem sofrimento
Piercings: sou uma medricas e isso de me andar a furar em sítios esquisitos assusta-me
Tatuagens: volto a dizer: sou uma medricas!
Quantas vezes o meu nome apareceu no jornal: algumas
Cicatrizes: neste último mês não fiz nenhuma. Já me chegam as 2 que tenho
Do que me arrependo de ter feito: uma vez roubei os bilhetes do carrossel ao meu irmão para eu andar duas vezes. Arrependo-me até hoje.
Cor favorita: verde em todas as suas variantes
Disciplina favorita na escola: sempre gostei muito de língua portuguesa mas a matemática fascinava-me
Um lugar onde nunca estive e gostaria de estar: Moçambique
Matutino ou nocturno: Nocturna. É à noite que fico mais criativa e que gosto de ter longas conversas. Detesto acordar cedo.
O que tenho no bolso: Não tenho bolsos
Em dez anos imagino-me: não posso revelar… mas a minha casinha amarela, com alpendre tem de lá estar!

terça-feira, outubro 16, 2007

Sopa de feijão manteiga

Ingredientes:
- 1 lata de feijão manteiga
- 250g de conselhos de um desconhecido

Receita:
Se quiser dexiar de ser um feijão manteiga esmagado na sopa do coração, oiça com atenção o que um desconhecido tem para lhe dizer.
Explicações:
Às vezes um conselho de alguém que não nos conhece consegue ser mais esclarecedor do que os que ouvimos das pessoas mais chegadas. Alguém que analise friamente uma situação, que não precise de tomar partidos.

Tal como numa sopa, a vida também precisa que se tape e destape a tampa do tacho de vez em quando. A minha tampa acabou de se destapar. Há que saber o momento exacto em que os ingredientes já não precisam de estar protegidos pelo calor desta guardiã. A mim, chegou a hora de enfrentar a corrente de ar da minha cozinha.

Viver e reviver o que já aconteceu consegue ser desgastante. Numa sopa, os feijões acabam por se desfazer se ficarem demasiado tempo ao lume. Eu, tal qual feijão manteiga que sou, decidi que estava na hora de continuar inteira.

Aqui fica uma proposta de música do Sting que eu adoro e que me inspira a recomeçar um “Brand New Day”. Quiçá desta vez como uma bela e robusta feijoca!

segunda-feira, outubro 15, 2007

Cuecas de banana flambè

Ingredientes:
- 1 banana
- cuecas mal escolhidas
- conselhos femininos qb

Receita:
Tapa-se a banana durante um dia inteiro com umas cuecas mal escolhidas. Quando chegar a hora da fervura vai certamente deixar alguém pouco "flambè".

Explicações:
As cuecas fazem toda a diferença quando chega a hora "flambè". Imaginem que estão a despir o Brad Pitt, em pleno acto de loucura e, de repente, dão com uma cuequinha azul pijama ou aos quadradinhos verdes e bordeaux. No mínimo, desmoralizante. Mais ainda se a bela de peúga não for retirada a tempo. Nisto estamos todas de acordo.

Este foi um dos grandes temas do dia entre o meio feminino que me rodeia e achei que devia partilhar convosco algumas das conclusões desta grave discussão. A cor é importante, o feitio nem se fala. Tal como os homens apreciam uma bela lingerie feminina, também nós gostamos de apreciar a mais íntima roupa masculina. Aqui ficam alguns conselhos a todos os meus amigos e leitores anónimos: esqueçam as cuecas, adoravelmente apelidadas de truces e quanto aos boxers largos, cheios de bonecada, façam o favor de os queimar numa fogueira.

Após uma breve recolha de opiniões, chegámos às grandes eleitas (por unanimidade): boxers Calvin Klein. Justinhas e pretas, não esquecer!
Depois disto, façam felizes as vossas mulheres com a sobremesa ;)

domingo, outubro 14, 2007

Euros de caramelo

Ingredientes:
- 500g de açúcar
- lume alto
- 0 euros na conta

Receita:
Leva-se uma conta bancária medíocre numa panela em lume brando durante anos a fio. Junta-se o açúcar e vai-se mexendo na esperança que nasça um caramelo.

Explicações:
Costuma-se dizer que o dinheiro não traz felicidade. Acho que, em parte, estão redondamente enganados. Ao fim de alguns anos às voltas no mercado de trabalho, com trocas de carreira e um recomeço atribuladamente sortudo, já chateia continuar a contar os trocos. Eu até sou uma daquelas caranguejas incuráveis para quem o "amor e uma cabana" poderiam ser lema de vida. No entanto, o meu ascendente em capricórnio começa a falar mais alto e repete todos os dias: "Maria, estás a afogar-te em dívidas".

Há coisas que me chateiam todos os meses. Por exemplo, em vez de comprar um champô de três euros da Panténe tenho de comprar o de 1,50 marca Carrefour. Se os amigos combinam uma jantarada sou a primeira a dizer: "Mas tem de ser num sítio barato". Se planeio fazer uma viagem de férias (a baixo-custo, acreditem! Até em sofás durmo) o cenário pós-diversão já sei qual é: conta negativa durante uns tempos e eu com a corda ao pescoço. Resumindo, tal com o açúcar precisa de um lume minimamente alto para se transformar num caramelo sólido e saboroso, também eu preciso de uma conta bancária minimamente alta (e atenção, não peço muito) para começar a solidificar a minha vida.

Irrita-me este sistema português onde quem mais dá o litro, mais anos demora a ser recompensado. A recompensa, diga-se, é um ordenado digno desse nome. Não ambiciono ter um BMW, nem roupas de marca. Mas ter impostos pagos a tempo e direito a um seguro de saúde já me parecia simpático. Não há esperança para esta minha geração que continua a ser explorada até ao tutano. Mesmo assim, o entusiamo que me rege não me permite baixar os braços e desanimar. Quanto mais a minha conta fica negativa mais eu trabalho e gosto do que faço. Serei eu burra?

quinta-feira, outubro 11, 2007

Os bombons da coragem

Ingredientes:
1 caixa de bombons
500g de coragem

Receita:
Passaram uns largos meses desde que decidiste ir embora. Recebi a notícia com aquela dignidade que me é característica. Não te despediste, isso não te perdoo. No momento em que desliguei o telefone senti que a injustiça do mundo caía nos meus ombros. Não era suposto teres desistido.
Ao longo destes meses foram muitas as vezes que chorei. Sozinha, claro. Como sabes não gosto que os outros me vejam chorar. Mesmo no dia em que foste embora sem olhar para trás, as minhas lágrimas correram às escondidas. A minha missão, como sempre, era deixar que todos pensassem que eu sou a muralha da China.

Tenho pensado ir visitar-te. Sei que já o devia ter feito, desculpa. Mas escondo-me na banal desculpa: não tenho tempo. A verdade é que sou uma cobarde. Não tenho coragem. Não quero admitir a mim mesma que não te vou voltar ouvir a rir.
Arrependo-me de todos os conselhos que nunca te cheguei a dar. De todas a vezes que pensei: tenho de adicionar o miudo no msn para pôr a conversa em dia. Nunca o cheguei a fazer. Arrependo-me de todas as vezes que tive vontade de te dizer que me orgulhava da força com que sugavas a vida. Também acho que nunca o fiz.
Decidi escrever sobre bombons porque sei que os adoras. Lembras-te do natal em que te apanhei atrás da árvore a devorar uma caixa de enfiada? Não devias, eras alérgico e a tua mãe ia-te matando. Mas é assim que te quero recordar para sempre. Um menino, todo lambuzado, com os olhos a brilhar de felicidade por comer um chocolate.

quarta-feira, outubro 10, 2007

A pizza da revelação

Ingredientes:
1 pizza
1 mulher

Receita-se:
Num jogo de paciência e imaginação, compara-se um jantar à base de pizza com a vida de uma mulher. As parecenças são mais do que se pode imaginar.

Explicações:
Esta foto transmite muito de mim. Observemos bem:

- A garra com que mordo esta garfada de pizza é a garra com que devoro a vida diariamente.

- A delicadeza com que saboreei cada pedaço daquele pitéu é a delicadeza com que saboreio as pequenas alegrias do meu dia-a-dia.

- A paciência com aguardei por aquele prato num restaurante de Padova, é a paciência com que aguardo diariamente por melhoras na minha vida profissional.

- A resignação quando chegou ao fim aquela maravilhosa pizza é a mesma resignação que sinto por aquilo que um dia provei ao de leve e que neste momento não posso ter.

- A satisfação de ter comido a melhor pizza de sempre equipara-se à satisfação que sinto por saber que tenho os melhores amigos do mundo.

- A forma como fechei os olhos para não esquecer aquele momento é a mesma com que fecho os olhos todas as noites e agradeço a vida que tenho.

segunda-feira, outubro 08, 2007

Pipocas de national geographic

Ingredientes:
200g de pipocas
50g de açúcar sonhador
1 pacote de sal

Receita:
Num tacho bem quente põe-se o milho com as 50g de açúcar sonhador. Quando as pipocas começam a estalar entorna-se o amargo do sal e desliga-se o lume… por uns tempos.

Explicações:
Tal como as pipocas saltam no tacho, o "national geographic" salta dentro do meu estômago cada vez que o coração dispara. Como diria a minha amiga Cátia, não são apenas borboletas, é uma verdadeira selva.

Há uns dias o "national geographic" voltou a dar sinais de existência, provando a mim mesma que o mundo continua a girar e a surpreender-nos, por mais que eu de há uns meses para cá teimasse em pensar que não.

Infelizmente o meu "national geographic" resolve sempre ser activado no canal errado. E eu, racional como ando, corto as vazas a qualquer pipoca que tente saltar dentro do meu tacho. É que cada vez que decido pôr-lhes açúcar, acabam por entornar o sal no cartucho e só se lembram de me avisar depois de eu ter mordido a primeira.

domingo, outubro 07, 2007

Entre uma francesinha e um jarro da casa

Ingredientes:
1 francesinha
1 jarro de tinto da casa
kilo e meio de frases nortenhas

Receita:
Num tabuleiro põem-se dois lisboetas,a francesinha e o jarro da casa. Liga-se o lume e enquanto se aguarda dizem-se umas boas frases nortenhas de mão na anca.

Explicações:
Ir ao Porto agrada-me sempre. Talvez porque sempre tive bons momentos lá.

Zona ribeirinha, dez da noite. Frente a uma francesinha e a um bom vinho da casa, dei por mim em grandes gargalhadas com o meu melhor amigo (Nuno, já lá vão 19 anos!). Fomos jantar ao sítio mais pitoresco possível... com faducho a tocar e um ambiente bem familiar. Três frases marcaram a noite e deixaram-me deliciada com o "à vontadinha" do pessoal do norte. De mão na anca, a empregada mais velha gritava com a mais nova por causa de uns talheres em falta:
"Olha lá, debes achar que eles bão comêr cus pés!"
Fui apanhada desprevenida e não consegui deixar de soltar uma gargalhada bem alta. Ela piscou-me o olho e completou o raciocínio: "Tem de ser menina! Os turistas gostam de achar que nós somos fodidas!".
Mas a melhor da noite ainda estava para chegar. Um alemão ao meu lado bebia cerveja como quem bebe água... coisa comum. À terceira caneca de meio litro, a fantástica empregada supera todas as minha expectativas: "Mais uma??! Fôgo, se fosse meu marido fodió tôdo! Punhó a dourmir debáixo da câma!".
Perante o meu ataque de riso e o de todos os portugueses presentes, o homem ainda me pediu para traduzir. Achei melhor dizer apenas que "o pessoal do Porto é muito brincalhão".

É incrível como Portugal é um país tão pequeno mas com tantas pessoas diferentes. É como se tivessemos dezenas de pequenos países, com diferentes culturas, dentro de um só. Foi um fim-de-semana de reencontros com o passado. Longas conversas, desabafos, confissões, gargalhadas, muitas gargalhadas. E claro, a nostalgia.

quinta-feira, outubro 04, 2007

Vinho de desencontros

Ingredientes:
500g de desencontros
1.43m de “Fado da procura”
vinho qb

Receita:
Durante um minuto e quarenta e três segundos ouve-se o “Fado da procura”, se possível, regado com um bom copo de vinho.

Explicações:
De há uns dias para cá não consigo parar de ouvir uma música deliciosa da Ana Moura: o “Fado da Procura”. A letra é de uma simplicidade maravilhosa. Será que também eu ando desencontrada?!



“Mas porque é que a gente não se encontra?
No largo da Bica fui-te procurar
Campo das Cebolas e eu sem te encontrar
Eu fui mesmo até à casa do fado
Mas tu não estavas em nenhum lado
Mas porque é que a gente não se encontra?
Mas porque é que a gente não se encontra?
Já estou sem saber o que hei-de fazer
Se seguir em frente, ai madre de Deus
Se voltar a trás, ai chiados meus
E o rio diz que tarde infeliz
Mas porque é que a gente não se encontra?
Mas porque é que a gente não se encontra?
Já estou farta disto, farta de verdade
Vou beber a bica, sentar e pensar
Ver se esta saudade, ai fica ou não fica
E talvez sem querer não querem lá ver
Sem te procurar te vejo a passar!”