terça-feira, abril 29, 2008

Notas soltas sobre temperos

Na culinária da vida é tudo uma questão de sal e pimenta. Quando é de menos não satisfaz, quando é a mais pode ser perigoso. Encontrar a pitada certa revela-se uma tarefa só para os chefs mais competentes. A mim foge-me o dedo para o exagero.

segunda-feira, abril 28, 2008

Sopa da dieta amorosa

Ingredientes:
1 lata de alimentos a evitar
Um pacote de atracção
Sal de inevitabilidade

Receita:
Numa panela cheia de água junta-se sal da inevitabilidade e mexe-se bem. Junta-se o pacote de atracção e esquece-se definitivamente as leis da dieta amorosa.

A atracção é como uma dieta: os alimentos a evitar são aqueles que mais temos vontade de levar para casa. Dou por mim ao longo dos anos em constantes tentativas falhadas de dietas amorosas. Sei precisamente quais são os nutrientes que eu não queria na minha vida, mas é por eles que acabo sempre por ficar balançada.
Os legumes (calmos, ponderados, etc) estariam (e teoricamente estão) no topo de qualquer ementa de uma cozinheira como eu. A evitar: todos os alimentos complicados e imprevisíveis. Mas não será o constante factor surpresa/loucura um tempero deveras tentador? Concluo que sim.
Mais uma vez deixo o sumo natural de lado para beber um tinto que sempre disse que não ia gostar. Troco a fruta pelo doce. Em vez da sopa opto por um belo chouriço assado. Neste universo gastronómico da vida, onde no meio das minhas indecisões consigo ser a cozinheira mais decidida do mundo, sigo o lema que marca o constante novo rumo da minha ementa: “porque não?”.

quarta-feira, abril 23, 2008

Carcaça assanhada

Ingredientes:
2 carcaças
1 panini
500g de olhares intensos

Há coisas que não dão para compreender. Mal sabia eu que durante uma viagem desde Veneza até Padova corri o risco de ser presa… por assédio sexual! Como conseguir tirar os olhos de um belo “panini”, quando somos umas carcaças portuguesas deslumbradas com o charme que só em Itália se encontra?
Esta semana um homem foi condenado por “olhar intensamente” para uma mulher num comboio. Desde quando é que olhar tira pedaço? Sempre fui adepta da modalidade “manter os olhos bem abertos". E se bem me recordo, não os fechei por um minuto (nem eu nem a minha grande companheira de viagem) quando à nossa frente se sentou um verdadeiro “Zorro”. Moreno, sorriso aberto, cabelo preto desgrenhado e um vozeirão de fazer tremer as pernas a qualquer carcaça. Nenhum pão saloio chegaria aos pés deste exemplar vindo das melhores panificadoras italianas. Entre cotoveladas e olhos a revirar, fomos provavelmente discretas. Ainda bem. Por esta altura estariamos numa qualquer prisão italiana condenadas a prisão perpétua por não conseguir parar de “olhar intensamente” para as fardas della polizia…

terça-feira, abril 22, 2008

Iogurte de coco... para sempre

O iogurte de coco vai ser para sempre o meu iogurte preferido. Posso gostar muito do de morango, de vez em quando do de frutos tropicais. Mas o de coco ultrapassa tudo. Tal como a letra desta música. É a letra que mais me tocou até hoje. Perfeita em cada frase. Como se tivesse sido escrita para mim. Tal qual o aroma a coco.

sexta-feira, abril 18, 2008

Puré de batata doce

Ingredientes:
Mtos kgs de batata
1 lata de indecisão
Racionalidade para polvilhar

Receita:
Se eu fosse um alimento, nesta fase seria certamente uma batata… indecisa. Cheia de força dos hidratos de carbono, mas com uma tendência para me transformar em puré. Por mais que eu saiba que a batata cozida é a mais saudável, não consigo resistir a vestir a camada emocionalmente gordurosa da batata frita. Daquelas que sabem bem no momento, mas depois deixam um gosto amargo, embora misturado com uma vontade inexplicável de as voltar a comer.
Na minha horta as batatas nascem à distância. Vários terrenos separam as batatas da minha indecisão. Por mais que tente arrancar da terra aquelas que já lá não deviam estar, acabo por não conseguir mais do que dar-lhes uma leve mexida com a enxada da minha racionalidade.
Na minha cabeça permanecem como belas batatas recheadas, ideais para acompanhar os bifes do coração. Uma ilusão que certamente teria fim se eu no fundo não fosse uma pateta de uma batata doce.

terça-feira, abril 15, 2008

Falta de fome, cozinha na falência

É por estas e por outras que não faço dieta. Tenho muito amor às minhas regueifas e à vontade de comer. Sou uma pessoa saudável... e isto também faz parte do processo de remodelações.

segunda-feira, abril 14, 2008

Torradinhas caseiras

Se há comida que me faz sempre sentir em casa são umas belas torradinhas. Transportam-me para as tardes em casa da minha avó quando era pequena, para as manhãs de sábado a tomar o pequeno-almoço com a minha mãe, para as ceias com o meu irmão depois de noites de copos e claro, para os lanches com os amigos em dias de inverno.
Seja em carcaça ou em pão saloio, as torradas são uma parte de mim. E foi ao som de uma torradinha (de panrico, mas pronto...), que descobri uma banda. Chamam-se Of a Revolution, apropriado para esta era de remodelações. Estou viciada numa música - não tanto como em torradas - e achei que devia partilhar convosco. A letra tem muito daquilo que eu sinto: "I feel home,when I see the faces that remember my own.I feel home,when I'm chilling outside with the people I know". Oiçam-na aqui, chama-se "I feel home".

sexta-feira, abril 11, 2008

Em busca de novos sabores

Porquê comer frango cozido quando temos frango com caril disponível na ementa? Há alturas em que a vida merece ser saboreada com ingredientes coloridos e aromas mais picantes. É o que tenho andado a fazer.
Na minha cozinha deixou-se de recorrer exclusivamente à gastronomia tradicional. Entrámos numa descoberta pelos novos sabores. Mudámos a frigideira pelo wok, a pimenta foi substituída pelas malaguetas, o açúcar deu lugar ao pau de canela. O lume deixou de ser brando e aquece agora a temperaturas mais altas. As receitas deixaram de ser tiradas conforme indicações de um livro a passaram a ser feitas “a olho”. Concluo que a vida tem mais sabor assim. Passo número dois da remodelação.

quarta-feira, abril 09, 2008

Com um sorriso e uma música me despeço do tacho mais gasto do meu armário. As remodelações incluem a chegada de novos trens de cozinha. Passo número um.

terça-feira, abril 08, 2008

Remodelações na cozinha

Um dia vou cortar às rodelas os meus receios e agir por impulso em vez de pensar duas vezes. Um dia vou deixar de temperar a minha vida com aromas lamechas. Um dia vou perceber o verdadeiro significado da receita "tu és especial", tantas vezes ditas em momentos de vinha d'alhos. Um dia vou deixar de sentir saudades dos ingredientes que não fazem falta ao meu cozinhado. Um dia vou abrir as tampas da panela que fui deixando ficar em pressão. Um dia vou deixar de planear o menu e deixar os sabores surgirem conforme me apetecer. Hoje é o dia (como nos momentos Nicola!). A minha cozinha acabou de entrar em remodelações firmes. Qualquer dia inauguro o meu lado mais gourmet!

sexta-feira, abril 04, 2008

Gafanhotos fritos

Ingredientes:
1 saca de gafanhotos desafiadores
500g de risco
loucura qb

Receita:
Dentro de cada um de nós há lado louco que poucas vezes se revela. Um gosto pelo perigo, uma atracção inevitável pelo desconhecido. Como se estivéssemos a um passo de entrar num restaurante de comida totalmente diferente daquilo a que estamos habituados.
Se me dessem a provar gafanhotos fritos certamente diria que não. Mas no fundo ficava a pensar sobre qual seria o seu gosto ou textura. Há alturas na vida em que é preciso arriscar e comer os gafanhotos. Pelo gozo de o fazer. Pelo atrevimento de meter de lado ideias pré-concebidas. Pela aventura.
Tenho uma travessa de gafanhotos fritos num tabuleiro inesperadamente estendido na minha direcção. Arrisco ou não arrisco? Corro o risco de apanhar uma intoxicação. Quem sabe se até sou alérgica… Mas se calhar até lhes vou deitar a mão.

quarta-feira, abril 02, 2008

Cerejas com chantilly

Há uns dias dei um passeio por Alfama e dei por mim a sorrir com uma frase escrita em letras grande e tortas, numa parede: "Quero fazer contigo aquilo que a Primavera faz com as cerejeiras". (foto roubada do site do mal)
Já citamos Neruda em Alfama... somos um país de poetas, disso não há dúvida. Enquanto caminhava pelas ruelas deste bairro que tanto gosto não pude deixar de pensar nesta frase. No fundo eu também quero que alguém faça nascer a cereja que há em mim. Com bicho ou sem bicho, há uma cereja bem encarnada aos trambolhões com vontade de renascer. "Ora amarga, ora doce", como diria o Vítor Espadinha. Mas se a primavera aparecer entretanto, que traga uma dose de chantilly. Para me lambusar.