quinta-feira, agosto 27, 2009

Papo-seco

Ao pequeno-almoço, ao almoço, ao jantar, ao lanche, à ceia… ou sempre que der a fome, na minha cozinha tem-se optado pelo papo-seco (o termo carcaça é feio). São muitos os que me perguntam: “Porquê papos-secos?”.
Ora bem, cada vez que opto por pães-de-leite o meu estômago dá-se mal. São demasiado moles. Falta-lhes consistência. O sabor doce é demasiado fugaz. Já os papos-secos são habitualmente rijos. Pães com conhecimento, sabedoria da culinária da vida (a melhor de todas). Embora com uma aparência à partida mais tosca, revelam-se delicados e abertos às mais doces compotas e marmeladas. A simplicidade com que encaram as refeições é um desafio, assim como a atitude decidida perante os restantes membros da padaria. Seja à mesa ou embrulhados num guardanapo, sabem estar em qualquer lado. Fazem o meu estômago sentir-se seguro. E só quem ainda não experimentou é que põe em duvida a sua capacidade calórica.
Cada vez tenho menos paciência para pães de leite. Lamento.

segunda-feira, agosto 24, 2009

Fruta ao natural

Este post esteve para se chamar “salsicha fresca”, mas quando descobrimos o lado mais saboroso de um prato, ser jocoso não cai bem no estômago.
Descobri o prazer da fruta ao natural. Juntam-se bananas com meloas… sem casca, nem revestimentos de açúcar. Laranjas com mamão, peras com pêssegos carecas. Sem preconceitos.
Há algo de libertador na fruta ao natural. É como saborear o que de mais fresco temos na cozinha e nunca temos a ousadia de provar. A mim soube-me bem. A partir de hoje, o avental está dispensado.

quarta-feira, agosto 19, 2009

Felicidade em castelo

Houve tempos em que o conto de fados era a minha realidade. Alegria misturada com excentricidade, numa casa onde a felicidade era batida em castelo. Nessa altura cozinhava-se ao som de guitarradas. Há muito que não me lembrava disto e uma banal conversa no msn acabou por me fazer lá voltar. Por um momento, revi-me naqueles castelos. E com os olhos a brilhar, senti saudades.


quinta-feira, agosto 13, 2009

Algodão doce

Leve… sem nenhum peso que não se desfaça na boca em segundos. Colorido… para fazer os olhos sorrir. Feito apenas de açúcar cristalizado… com o brilho que nestas coisas se quer. Doce. No fundo, tudo se resume a isto:

quarta-feira, agosto 12, 2009

Bolo de caco

Há semanas em que somos amassados de todos os lados. Nunca percebi muito bem se era essa a receita do bolo do caco, mas acho que se enquadra.
No único dia do ano em que me dou ao luxo de ficar doente e ir para casa enfiar-me na cama, surge o telefonema que ninguém quer ouvir. É o número da mãe e atendo com um impaciente “diz lá”. Do outro lado, uma voz masculina: “Olhe desculpa lá mas a sua mãe desmaiou no meio da estrada e não consegue falar”.

Não me lembro de como atravessei a cidade, mas fui rápida. Demais. Seguiu-se uma noite no hospital, mil e um exames e uma dose de mimos extra em que me tornei perita ao longo dos anos. No esquecimento ficou o facto anual de eu estar doente.
Com todas as preocupações do mundo concentradas no meu estômago de caco - misturadas numa pitada de exageros e umas belas doses de anti-inflamatórios - acabo por ir ao médico de família que, pela primeira vez na minha vida, me examina. Veredicto: já estive mais nova… e com uma úlcera a menos. Mas a cozinha continua a funcionar… as usual…

segunda-feira, agosto 10, 2009

Uma questão de liberdade gastronómica

Há pequenos gestos que demoram muito tempo até que sejamos capazes de os fazer. Apagar um nome do menu, por exemplo. Ou desligar o telefone e restantes meios de contacto, de forma a deixarmos de atender pedidos descabidos fora de horas. Quem sabe, também ocultarmos da lista do supermercado aquele ingrediente que invariavelmente ainda nos incomoda porque simplesmente continua visível onde menos esperamos.
Mas quando o conseguimos fazer – e acreditem que é mais difícil do pode parecer – há uma sensação de liberdade incrível. Como se voltasse a ser capaz de ver. Ver. É o que eu acabo de sentir.

sábado, agosto 08, 2009

Quinta da Aveleda

Uma tarde fora de folga da cozinha. Juntam-se dois companheiros de alhadas e, numa praia algures na Arrábida, inicia-se uma espontânea viagem aos sabores da Quinta da Aveleda. Uma viagem: duas línguas a ficarem mais rápidas e o raciocínio mais lento. Duas viagens: muitas gargalhadas e telefonemas disparatados. Três viagens: o caldo entornado… na vertigem da estrondosa amizade que os une. Confissões que não se repetem. Uma alegria que, embora alcoólica, é verdadeira. Mesmo com ressaca… Impagável.

quarta-feira, agosto 05, 2009

Al Dente

Não há cozedura que me deixe em papa. Nem azeite que me faça escorregar até cair da travessa. Não esquecendo a idade que tenho (algum dia tinha de ser), sinto-me "al dente". Com vontade de cozinhar cada prato como se fosse o último. Cheia de sonhos. Mas rija, como sempre mostrei (ter de) saber ser. E, pelo meio, em busca de um molho que me faça amolecer.

terça-feira, agosto 04, 2009

Coração de manteiga

Chega o calor o o meu lado mais amanteigado continua guardado no frigorífico. O que em tempos se derreteu até ficar coalhado, está agora a salvo das altas temperaturas. Sem qualquer Primor.
Resisto a queijos amanteigados e acabo por deixar-me tentar apenas por situações em que não tenha de ser Mimosa. Mas rapidamente concluo (novamente) que não fui feita apenas para comer: gosto de meter a faca, barrar, cheirar e por fim saborear.
Mais do que frio, o meu coração de manteiga está vazio. O que de azedo cá estava, saiu. E sem ninguém que me faça perder o sono, olho para o relógio da cozinha sem perceber onde andará o meu original fire... o lume permanece apagado.