sexta-feira, abril 29, 2011

Refeições ao luar

Na minha cozinha sempre se gostou dos nasceres do sol. Mas quer a vida que os maiores refogados sejam levados ao lume depois de ele se pôr.

domingo, abril 24, 2011

Mistura de vegetais

Houve quem os descascasse, camada por camada, sem sequer ter a real noção de que o estava a fazer. Mas houve também quem a tivesse toda. O que fazer com essas cascas, empoeiradas pela terra da horta regada a lágrimas escondidas, é que ninguém soube. Nem sei se algum dia saberá.

Olho para o caixote ao lado do fogão e vejo os despojos. Amarelecidos por emoções desgastantes. Pisados por mãos descuidadas. Por tantos excessos que nunca serão demasiado excessivos. Por silêncios que dizem mais que mil palavras, mas que apodrecem a frescura que ainda lhes era devida. Cascas de mil cores e texturas. Àsperas. Macias. Rugosas. Cinzentas, mas com genuina cor.

Em pedaços, o miolo de todas ela observa-se. Sabendo que as restantes camadas serão cada vez mais difíceis de arrancar. Não porque não tenha vontade. Apenas porque não consegue ceder a mais mãos daquelas. Nem das outras. Porque o que um dia foi um cesto de verduras resplandecentes na bancada da cozinha é agora um discreto saco de vegetais congelados. Aberto aos temperos da culinária da vida mas eternamente conservado no frio. Com medo de se queimar.

sábado, abril 02, 2011

Churrasco queimado

Há cheiros que não nos deviam abrir o apetite da memória quando menos esperamos. O aroma de um certo perfume intenso, misturado com suor e tabaco, é um deles.