sábado, outubro 16, 2010

Pão com mel

Quando a barriga fica fria de gula a meio da noite, nada como uma ida furtiva à cozinha. Sabemos estar a pisar o risco, mas o fator caloricamente proibido faz com a saliva se forme na boca com a irracionalidade que toda a vontade irremediável de comer contém.
No maior dos silêncios, mas com a maior das urgências, tira-se o pão do saco. O pote de mel abre-se com a ajuda das mãos trémulas. O miolo do pão entranha-se no mel demoradamente. Lambem-se os lábios. Lambem-se os dedos peganhentos. Contra o armário, as dentadas são ávidas, numa corrida contra o tempo. Ninguém pode ver. Ninguém pode saber. Mas no fim não há culpas. Nem sequer palavras. Limpam-se as migalhas para não deixar vestígios. Apenas o cheiro poderia denunciar a cedência à gula.
Horas depois percebo que não havia necessidade daquela refeição secreta. Mas foi isso mesmo que a tornou tão saborosa. Digna dos melhores menus.

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